Autismo e outono: o segredo para uma transição tranquila
- Cátia Soares
- 6 de out.
- 3 min de leitura

O verão despede-se lentamente. Os dias ficam mais curtos, as manhãs mais frias e as rotinas voltam a ajustar-se. Para muitas pessoas, estas mudanças fazem parte do ciclo natural do ano. Mas para pessoas autistas — especialmente crianças — a transição de estação pode ser um verdadeiro desafio.
Mudanças que se sentem (mais do que se vêem)
A chegada do outono traz uma série de alterações sensoriais: a luminosidade diminui, o vento arrefece, as roupas tornam-se mais pesadas e os cheiros e sons à volta mudam. Para quem tem uma maior sensibilidade sensorial, como acontece com muitas pessoas no espectro do autismo, estas pequenas mudanças podem ser intensas, inesperadas e desconfortáveis.
Além disso, o regresso às rotinas escolares, a adaptação a novos horários e a menor previsibilidade do clima podem aumentar a ansiedade e o stress. O corpo e o ambiente mudam ao mesmo tempo — e isso pode ser demasiada informação para processar.
Como apoiar de forma acessível e empática
O primeiro passo é reconhecer que a mudança de estação é real e sentida. Pequenas adaptações no ambiente e na rotina podem fazer uma grande diferença. Eis algumas medidas de acessibilidade simples:
Preparar antecipadamente — conversar sobre o que muda no outono, mostrar imagens de folhas a cair, roupas diferentes e novas rotinas.
Manter previsibilidade — usar calendários visuais ou quadros de rotinas para ajudar a antecipar o que vem a seguir.
Ajustar o ambiente sensorial — verificar a intensidade da luz, evitar ruídos súbitos e garantir conforto térmico.
Oferecer opções — permitir escolher a roupa, o lanche ou a atividade, ajudando a manter um sentido de controlo.
Validar sentimentos — em vez de minimizar o desconforto (“não é nada!”), reconhecer (“estás a sentir o frio diferente, é normal”).
A contribuição da Análise Comportamental Aplicada (ABA)
A ABA pode ser uma ferramenta preciosa neste contexto — não apenas como técnica, mas como forma de compreender o comportamento à luz do ambiente e das necessidades individuais.
Aqui estão algumas formas de aplicar princípios da ABA para facilitar a transição:
Reforço positivo
Elogiar e reforçar comportamentos de adaptação, como aceitar uma nova rotina ou experimentar um novo casaco, ajuda a aumentar a probabilidade de esses comportamentos se repetirem.
Modelagem gradual
Introduzir mudanças aos poucos. Por exemplo, usar a roupa de outono dentro de casa durante alguns minutos por dia antes de a usar na rua.
Histórias sociais e role-play
Criar pequenas narrativas visuais sobre o que muda no outono (chuva, folhas, frio) e o que a criança pode fazer em cada situação.
Treino de tolerância
Trabalhar, de forma segura e planeada, a exposição a novos estímulos (como sons de vento ou texturas de roupa), com reforços positivos e pausas sensoriais.
Comunicação funcional
Ensinar formas de pedir ajuda ou expressar desconforto (“estou com frio”, “preciso de silêncio”, “quero trocar de roupa”) é uma das estratégias mais poderosas para reduzir crises e aumentar a autonomia.
Pequenas mudanças, grandes resultados
A transição do verão para o outono é inevitável — mas o desconforto não precisa de ser. Com empatia, preparação e estratégias baseadas na ciência comportamental, podemos tornar esta passagem mais leve, previsível e tranquila para as pessoas autistas e para as famílias que as acompanham.
Porque crescer num mundo acessível é, afinal, o verdadeiro segredo para florescer em qualquer estação.





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